O instante ao qual chegamos nesta hora é decisivo. Diante de nossos olhos são edificados alguns dos pilares-base de nossas vidas. O passado e o futuro se reúnem para trazer à memória momentos pontuais e significativos bem como para nos conduzir à projeção do que nos espera.
Os desafios serão grandes. Portanto, gostaria de, neste momento que me foi reservado, apontar alguns destes desafios. Uns para nossa lembrança; outros para projeção do futuro e ainda outros para definição de nossa identidade, como aquilo que somos e o que pretendemos ser em nossos ministérios:
O primeiro desafio é pastorear àqueles que esperam receber em seus presbitérios e igrejas apenas teólogos. Ouviu-se, por um tempo, a infundada acusação de esta escola forma apenas teólogos e não forma pastores. O principal argumento dos que assim pensam é que esta escola privilegia o estudo acadêmico em detrimento da piedade, como se ambas as coisas pudessem ser separadas. Achavam que este Seminário era acadêmico demais para formar homens comprometidos com as pessoas e que tivessem a capacidade de sair de seus gabinetes para se relacionar com os crentes e com a sociedade em geral. Estamos aqui nesta noite para dizer que, com a ajuda da graça de Deus, seremos pastores. Aprendemos, nestes anos de estudo, que este Seminário privilegia a formação pastoral. Com um ensino sólido das Escrituras, vivenciamos alguns momentos nos quais era quase impossível dizer se estávamos sendo acadêmicos ou pastorais. Aprendemos que todo pastor precisa ser teólogo, porque o exercício da verdadeira teologia é o genuíno relacionamento com Deus. Portanto, não aceitamos a separação entre pastor e teólogo. Para nós, ser pastor é exercer o ministério da Teologia, cuja base é a revelação insofismável de Deus. A nosso ver, um pastor que não é teólogo não deveria ser chamado pastor, pois ser teólogo é aprender de Deus, por meio das Escrituras, com a iluminação de seu santo Espírito. Demos, neste seminário, os primeiros passos para o aprendizado do ministério pastoral, mediante o contato íntimo com uma teologia estruturada, sólida e sem escoriações próprias de um relativismo que, em nome de uma tolerância multifacetada, tangencial e líquida, pretende diluir os fundamentos. Sob a orientação de nossos mestres, cujos ministérios têm sido forjados pela ação de Deus, apreendemos com os seus próprios exemplos e palavras, a fim de reconstruirmos em nossas vidas pastorais seus melhores acertos e, com seus erros, aplainarmos nossas trajetórias. Mediante uma teologia pastoral subsidiada pela Escritura Sagrada, adotamos a teologia reformada como sendo o fundamento de nossas pressuposições para o exercício ministerial. Assim sendo, surge um novo desafio, ainda maior do que este que acabo de lhes apresentar.
O segundo desafio que já bate à nossa porta há algum tempo, que tem sido provado por nossos mestres, o qual alguns de nós vimos presentemente, é o de assumirmos, sem medo e corajosamente, a defesa da teologia reformada. Não é necessário que tenhamos medo de dizer que somos reformados. Para os que preferirem, calvinistas. É possível que, dentre nós, alguém seja tentado a excluir do seu vocabulário o termo reformado, ou ainda pior, abster-se da prática reformada, temendo ser ele mesmo excluído do grupo eclesiástico ao qual pertence e receber a pecha de fundamentalista, radical ou, até mesmo, carnal. Gostaria de lembrar-lhes, meus caros irmãos, que o que aprendemos neste seminário, é que a teologia reformada é bíblica. Esta é a razão pela qual devemos defendê-la. Não podemos abandoná-la de nossa prática pastoral. Lembrem-se de que nossos mestres nos motivaram a ver, na teologia reformada, a melhor e mais bem estruturada exposição das Escrituras. Lembrem-se de que não fomos chamados para negociar princípios e sermos politicamente corretos com aqueles que, em nome do pragmatismo e de uma tolerância infantilizada, comentem o gravíssimo erro da deserção. Estes abandonaram o firme fundamento teológico que nossos pais edificaram sobre o sangue de muitos mártires e que a História escreveu em seus anais, a fim de que as astúcias dos homens pós-modernos, que tentam liquefazer a verdade, sejam obliteradas em nossas igrejas. O desafio de manter firme o fundamento é nosso. Estamos hoje declarando que, ao sairmos daqui, sairemos para a batalha. O campo nos espera. Seremos claros em nosso ensino, firmes em nossas posições, sólidos em nossa defesa e permaneceremos fincados na rocha sobre a qual pisaram nossos mestres. Este relativismo positivo, por assim dizer, propõe uma filosofia da compreensão, pautada, com evidência clara, na rejeição ao domínio do expansionismo dos grandes impérios sobre os menores; na epistemologia da cultura, que sustenta a tese de que toda cultura reflete suas próprias necessidades, sua maneira singular e suas condições naturais; e, por conseqüência, na proposição de que o bárbaro é sempre uma visão cultural. Por outro lado, o relativismo traz consigo seu equivalente moral, de modo que a cultura passa a negar qualquer verdade que seja universal. Desse modo, não existem valores universais, costumes universais, mas apenas manifestações específicas de uma determinada cultura. De um lado, essa visão ajuda a entendermos a cultura em si; por outro, acena sempre para um rompimento moral edificado pelas grandes instituições sociais.Portanto, este é um desafio: não negarmos aquilo que aprendemos, tornando-nos desonestos e desonrosos para com a escola responsável por estas sólidas bases.
O terceiro desafio é contrariar a estatística de que há mais pastores do que campo. Precisamos relembrar aqui o ensinamento do nosso Senhor Jesus Cristo. Ele nos disse que deveríamos rogar ao Senhor da seara que mandasse trabalhadores para a sua seara. É estranho imaginar que um mundo globalizado e pós-moderno, cujas pressuposições religiosas exigem um contraponto efetivo e evidenciado, não necessite de trabalhadores para a seara. Se for excedente o número de trabalhadores então a seara não é tão grande assim. E se a seara já é tão grande, estamos na contramão dos dados e os senhores poderiam imaginar, portanto, que toda esta solenidade não faz sentido algum. Não acredito, entretanto, que Deus queira que interrompamos nossas orações, a fim de que os enviados sejam diminuídos, porque a sua seara já está completa. Por outro lado, não podemos desprezar o fato de que as estatísticas mostram que há, na Igreja Presbiteriana do Brasil, um grande número de pastores sem igrejas para pastorear. Eis, pois, um desafio: conciliar o chamado de Jesus para a grande seara com a estatística que declara haver falta de campo. Confrontando os dados, vê-se, numa rápida análise, que há alguma incoerência nesta proposição, pois se existe uma seara a ser alcançada, há necessidade de pastores que pastoreiem estas ovelhas que serão reunidas. O problema, então, deve ser visto noutra perspectiva: muitas igrejas não têm condições financeiras de sustentar com dignidade os seus pastores. E, infelizmente, por outro lado, muitos pastores que se encontram confortavelmente instalados em suas igrejas, especialmente nos grandes centros, não querem se disponibilizar a ir a determinados campos, por julgarem-nos incompatíveis com suas comodidades. Portanto, meus caros colegas, ao sairmos daqui e entrarmos em nossos presbitérios, deve pesar sobre nós a decisão de termos que, se necessário, abrir mão de nossos próprios confortos e alguns projetos para o bem do ministério e para a honra de nosso chamado. Ouvimos isto na teoria algumas vezes, mas talvez agora experimentaremos na prática. Por favor, caros colegas, olhem para frente. Vejam aqueles que nos esperam para pastoreá-los. Eles aprenderão conosco a abnegação e o amor. Eles verão nos nossos olhos o brilho daquilo que nos encanta e do que nos destrói. Prezados senhores e senhoras, olhem para frente. Vejam nos rostos de todos nós os semblantes de seriedade e de temor diante do desafio aterrador que pesa sobre nossos ombros de renegar nossos principais prazeres para obedecermos ao chamado do Senhor. Mas, pela graça de Deus, isto não se constitui desânimo para nós, pois temos o nosso Senhor Jesus Cristo como o padrão de abnegação, ao subtrair de sua posição de senhor para ser servo e obediente ao Pai. Ele mesmo nos chamou para sermos servos e aprendermos no sofrimento a verdadeira abnegação e o verdadeiro amor, com os quais estaremos municiados para vencer os desafios de nossa vaidade e de nossas pretensões.
Eis que surge o quarto desafio: vencer em nós mesmos a ilusão de que já estamos prontos e de que não precisamos aprender mais nada. Não há pecado maior do que o orgulho. A vaidade é condenada em toda Escritura. Ela é idolatria. A vaidade é um vício que nasce dentro de nós à medida que julgamos ser ou ter aquilo que não somos ou temos. É a desvirtuação dos significados mais primários da vida cristã. A vaidade é a dinamite que implode o edifício espiritual construído sobre a base da abnegação. Caros colegas, nós estamos aqui nesta noite para dizermos primeiramente para nós mesmos que não estamos prontos e que não somos donos exclusivos da verdade. A verdade é uma só, ela existe, nós cremos. Mas isso não significa dizer que nós a conheçamos completamente. Ao longo destes anos, recebemos de nossos mestres os pontos basilares e a indicação das vias principais pelas quais devemos andar para nos achegarmos cada vez mais próximos à verdade. Mas não sabemos tudo. Aliás, sabemos tão pouco que o que julgamos que sabemos deveria ser exatamente a pressuposição de que precisamos aprender mais. Nenhum de nós tem a pretensão de saber toda a teologia e oferecer respostas acabadas, exceto nas questões essenciais do evangelho, comunicada a todo cristão na Palavra revelada de Deus, mediante iluminação do Espírito Santo. Cabe-nos, portanto, tendo em mãos este mapa que foi desenhado por nossos mestres, seguir os caminhos mais viáveis e seguros em busca de nosso aperfeiçoamento. Cabe-nos, mediante a graça de Deus, por meio de seu santo Espírito, debruçarmos sobre a Escritura, tendo-a na mais alta estima, pensando cada palavra que a compõe, desenhando em nossas mentes todas as pinturas que Deus nos revelou para, dia a dia, crescermos em comunhão com ele. A humildade precede a honra, diz-nos o provérbio. No nosso contexto, o status político e a busca de poder afogam nas águas turvas das intenções pessoais a precedência da honra, que até mesmo entre os descrentes é valorizada como marca essencial e limítrofe das relações de poder. Nosso Senhor Jesus Cristo nos ensinou, na prática, que a obtenção da autoridade não estabelece causa e conseqüência com as posições de poder. Ele nunca requereu poder político, cargos ou títulos. Sua principal virtude era se identificar pela autoridade de suas palavras, que nunca contrariavam sua prática, pela honra de seu compromisso e pela obediência ao Senhor. Mesmo sendo Deus, não quis ser igual, antes se tornou servo e foi obediente até a morte, e morte de cruz. Fomos chamados para a cruz. Não fomos chamados para projeção política nem para nos tornarmos conhecidos. Fomos chamados para tornar Cristo conhecido. Importa, portanto, que ele cresça e que nós diminuamos. Este é o nosso desafio: ser cada vez menos e tornar Cristo cada vez mais em nossas vidas. Como escreveu o evangelista Moody, “O princípio da grandeza é ser pequeno; o acréscimo da grandeza é ser menos; e a perfeição da grandeza é ser nada”.
O quinto desafio consiste em sermos gratos por aquilo que somos. A ingratidão é uma das piores paixões humanas. Jesus Cristo experimentou isto quando, ao curar os dez leprosos, apenas um voltou para agradecer a ele a cura efetuada. A nossa tendência pecaminosa é a de não sermos gratos. Mas, meus irmãos, saiamos daqui hoje com os nossos corações radiantes de gratidão. Foram muitos os momentos preciosos pelos quais passamos. Hoje as nossas famílias estão aqui para vivenciar conosco esta solenidade. Muitos membros de nossas igrejas estão aqui para nos abraçar. Alguns deles nem imaginam a dificuldades pelas quais passamos. Poucos vão poder compreender a razão de sofrermos ao longo destes anos. Porém, ao olhar nos olhos de cada um, podemos ler em suas próprias retinas, aclaradas pelo licor de suas lágrimas, a difícil trajetória até este dia. Mas as dificuldades não foram tudo. Elas trouxeram consigo as imensas e, talvez, mais significativas alegrias de toda nossa vida. É que a maneira como Deus nos molda é singular. O sofrimento, para muitas pessoas, é penalidade por pecados ou merecimento por conseqüência de ser. Entretanto, para nós, crentes no Senhor Jesus Cristo, o sofrimento é, antes de tudo, uma tipologia rica e instrutiva do significado do aperfeiçoamento que Deus deseja de cada um de nós. Passar por privações, como muitos de nós passamos, é poder experimentar o treinamento para a obra que é, antes de mais nada, o início das privações. É a maneira pela qual Deus nos diz, constantemente, que somos apenas servos. Não somos donos de nossas vidas, mas administradores, ou para usar um termo bíblico-teológico, despenseiros dos mistérios de Deus. Somos mordomos de nossa vida, o que significa que tudo o que passamos é para a glória de Deus e não nossa. Portanto, devemos ser gratos, porque Deus nos forjou nestes anos. Devemos ser gratos, porque ele usou os seus servos, nossos professores e os funcionários do Seminário, os pastores, presbíteros, diáconos com quem trabalhamos nas diversas igrejas; Deus usou os membros de nossas igrejas para nos moldar; Deus usou também os nossos familiares, alguns bem distantes geograficamente, outros mais próximos, mas muitos sempre presentes. Deus usou nossos tutores eclesiásticos. Alguns foram mais do que tutores, foram pais, pastores e amigos. Eles não precisavam ser amigos, bastava ser tutores. Mas o verdadeiro tutor é um mestre que ensina o seu discípulo. Muitos de nós aprendemos com eles. Por fim, meus irmãos, Deus usou cada um de nós para sermos bênção para os nossos pares. As discussões em sala de aula, com os debates acirrados, as brincadeiras, as imitações, os sorrisos, as lágrimas, os abraços apertados, os pedidos de perdão, os cafés, o futebol, o companheirismo. Tudo isso e muito mais foram marcas que serão indelevelmente gravadas em nossas memórias. Nossas memórias hoje registram este instante único e inesquecível. O presente que se constitui pelo passado e pela projeção do futuro. Um futuro que nos separa. Um futuro que leva cada um de nós para o seu espaço próprio e, quem sabe, solitário. Ao sairmos, talvez demoraremos muito para nos vermos outra vez. Talvez nem nos veremos mais. Porém, meus irmãos, algo extraordinário nos une, nos aproxima e garante que estaremos juntos, apesar de distantes: somos servos de um único Senhor, chamados para o mesmo propósito, e um dia nos encontraremos com ele e o veremos face a face e daremos conta de nossas obras. Este é o maior de todos os desafios.
Que Deus nos abençoe!
Muito obrigado!
Os desafios serão grandes. Portanto, gostaria de, neste momento que me foi reservado, apontar alguns destes desafios. Uns para nossa lembrança; outros para projeção do futuro e ainda outros para definição de nossa identidade, como aquilo que somos e o que pretendemos ser em nossos ministérios:
O primeiro desafio é pastorear àqueles que esperam receber em seus presbitérios e igrejas apenas teólogos. Ouviu-se, por um tempo, a infundada acusação de esta escola forma apenas teólogos e não forma pastores. O principal argumento dos que assim pensam é que esta escola privilegia o estudo acadêmico em detrimento da piedade, como se ambas as coisas pudessem ser separadas. Achavam que este Seminário era acadêmico demais para formar homens comprometidos com as pessoas e que tivessem a capacidade de sair de seus gabinetes para se relacionar com os crentes e com a sociedade em geral. Estamos aqui nesta noite para dizer que, com a ajuda da graça de Deus, seremos pastores. Aprendemos, nestes anos de estudo, que este Seminário privilegia a formação pastoral. Com um ensino sólido das Escrituras, vivenciamos alguns momentos nos quais era quase impossível dizer se estávamos sendo acadêmicos ou pastorais. Aprendemos que todo pastor precisa ser teólogo, porque o exercício da verdadeira teologia é o genuíno relacionamento com Deus. Portanto, não aceitamos a separação entre pastor e teólogo. Para nós, ser pastor é exercer o ministério da Teologia, cuja base é a revelação insofismável de Deus. A nosso ver, um pastor que não é teólogo não deveria ser chamado pastor, pois ser teólogo é aprender de Deus, por meio das Escrituras, com a iluminação de seu santo Espírito. Demos, neste seminário, os primeiros passos para o aprendizado do ministério pastoral, mediante o contato íntimo com uma teologia estruturada, sólida e sem escoriações próprias de um relativismo que, em nome de uma tolerância multifacetada, tangencial e líquida, pretende diluir os fundamentos. Sob a orientação de nossos mestres, cujos ministérios têm sido forjados pela ação de Deus, apreendemos com os seus próprios exemplos e palavras, a fim de reconstruirmos em nossas vidas pastorais seus melhores acertos e, com seus erros, aplainarmos nossas trajetórias. Mediante uma teologia pastoral subsidiada pela Escritura Sagrada, adotamos a teologia reformada como sendo o fundamento de nossas pressuposições para o exercício ministerial. Assim sendo, surge um novo desafio, ainda maior do que este que acabo de lhes apresentar.
O segundo desafio que já bate à nossa porta há algum tempo, que tem sido provado por nossos mestres, o qual alguns de nós vimos presentemente, é o de assumirmos, sem medo e corajosamente, a defesa da teologia reformada. Não é necessário que tenhamos medo de dizer que somos reformados. Para os que preferirem, calvinistas. É possível que, dentre nós, alguém seja tentado a excluir do seu vocabulário o termo reformado, ou ainda pior, abster-se da prática reformada, temendo ser ele mesmo excluído do grupo eclesiástico ao qual pertence e receber a pecha de fundamentalista, radical ou, até mesmo, carnal. Gostaria de lembrar-lhes, meus caros irmãos, que o que aprendemos neste seminário, é que a teologia reformada é bíblica. Esta é a razão pela qual devemos defendê-la. Não podemos abandoná-la de nossa prática pastoral. Lembrem-se de que nossos mestres nos motivaram a ver, na teologia reformada, a melhor e mais bem estruturada exposição das Escrituras. Lembrem-se de que não fomos chamados para negociar princípios e sermos politicamente corretos com aqueles que, em nome do pragmatismo e de uma tolerância infantilizada, comentem o gravíssimo erro da deserção. Estes abandonaram o firme fundamento teológico que nossos pais edificaram sobre o sangue de muitos mártires e que a História escreveu em seus anais, a fim de que as astúcias dos homens pós-modernos, que tentam liquefazer a verdade, sejam obliteradas em nossas igrejas. O desafio de manter firme o fundamento é nosso. Estamos hoje declarando que, ao sairmos daqui, sairemos para a batalha. O campo nos espera. Seremos claros em nosso ensino, firmes em nossas posições, sólidos em nossa defesa e permaneceremos fincados na rocha sobre a qual pisaram nossos mestres. Este relativismo positivo, por assim dizer, propõe uma filosofia da compreensão, pautada, com evidência clara, na rejeição ao domínio do expansionismo dos grandes impérios sobre os menores; na epistemologia da cultura, que sustenta a tese de que toda cultura reflete suas próprias necessidades, sua maneira singular e suas condições naturais; e, por conseqüência, na proposição de que o bárbaro é sempre uma visão cultural. Por outro lado, o relativismo traz consigo seu equivalente moral, de modo que a cultura passa a negar qualquer verdade que seja universal. Desse modo, não existem valores universais, costumes universais, mas apenas manifestações específicas de uma determinada cultura. De um lado, essa visão ajuda a entendermos a cultura em si; por outro, acena sempre para um rompimento moral edificado pelas grandes instituições sociais.Portanto, este é um desafio: não negarmos aquilo que aprendemos, tornando-nos desonestos e desonrosos para com a escola responsável por estas sólidas bases.
O terceiro desafio é contrariar a estatística de que há mais pastores do que campo. Precisamos relembrar aqui o ensinamento do nosso Senhor Jesus Cristo. Ele nos disse que deveríamos rogar ao Senhor da seara que mandasse trabalhadores para a sua seara. É estranho imaginar que um mundo globalizado e pós-moderno, cujas pressuposições religiosas exigem um contraponto efetivo e evidenciado, não necessite de trabalhadores para a seara. Se for excedente o número de trabalhadores então a seara não é tão grande assim. E se a seara já é tão grande, estamos na contramão dos dados e os senhores poderiam imaginar, portanto, que toda esta solenidade não faz sentido algum. Não acredito, entretanto, que Deus queira que interrompamos nossas orações, a fim de que os enviados sejam diminuídos, porque a sua seara já está completa. Por outro lado, não podemos desprezar o fato de que as estatísticas mostram que há, na Igreja Presbiteriana do Brasil, um grande número de pastores sem igrejas para pastorear. Eis, pois, um desafio: conciliar o chamado de Jesus para a grande seara com a estatística que declara haver falta de campo. Confrontando os dados, vê-se, numa rápida análise, que há alguma incoerência nesta proposição, pois se existe uma seara a ser alcançada, há necessidade de pastores que pastoreiem estas ovelhas que serão reunidas. O problema, então, deve ser visto noutra perspectiva: muitas igrejas não têm condições financeiras de sustentar com dignidade os seus pastores. E, infelizmente, por outro lado, muitos pastores que se encontram confortavelmente instalados em suas igrejas, especialmente nos grandes centros, não querem se disponibilizar a ir a determinados campos, por julgarem-nos incompatíveis com suas comodidades. Portanto, meus caros colegas, ao sairmos daqui e entrarmos em nossos presbitérios, deve pesar sobre nós a decisão de termos que, se necessário, abrir mão de nossos próprios confortos e alguns projetos para o bem do ministério e para a honra de nosso chamado. Ouvimos isto na teoria algumas vezes, mas talvez agora experimentaremos na prática. Por favor, caros colegas, olhem para frente. Vejam aqueles que nos esperam para pastoreá-los. Eles aprenderão conosco a abnegação e o amor. Eles verão nos nossos olhos o brilho daquilo que nos encanta e do que nos destrói. Prezados senhores e senhoras, olhem para frente. Vejam nos rostos de todos nós os semblantes de seriedade e de temor diante do desafio aterrador que pesa sobre nossos ombros de renegar nossos principais prazeres para obedecermos ao chamado do Senhor. Mas, pela graça de Deus, isto não se constitui desânimo para nós, pois temos o nosso Senhor Jesus Cristo como o padrão de abnegação, ao subtrair de sua posição de senhor para ser servo e obediente ao Pai. Ele mesmo nos chamou para sermos servos e aprendermos no sofrimento a verdadeira abnegação e o verdadeiro amor, com os quais estaremos municiados para vencer os desafios de nossa vaidade e de nossas pretensões.
Eis que surge o quarto desafio: vencer em nós mesmos a ilusão de que já estamos prontos e de que não precisamos aprender mais nada. Não há pecado maior do que o orgulho. A vaidade é condenada em toda Escritura. Ela é idolatria. A vaidade é um vício que nasce dentro de nós à medida que julgamos ser ou ter aquilo que não somos ou temos. É a desvirtuação dos significados mais primários da vida cristã. A vaidade é a dinamite que implode o edifício espiritual construído sobre a base da abnegação. Caros colegas, nós estamos aqui nesta noite para dizermos primeiramente para nós mesmos que não estamos prontos e que não somos donos exclusivos da verdade. A verdade é uma só, ela existe, nós cremos. Mas isso não significa dizer que nós a conheçamos completamente. Ao longo destes anos, recebemos de nossos mestres os pontos basilares e a indicação das vias principais pelas quais devemos andar para nos achegarmos cada vez mais próximos à verdade. Mas não sabemos tudo. Aliás, sabemos tão pouco que o que julgamos que sabemos deveria ser exatamente a pressuposição de que precisamos aprender mais. Nenhum de nós tem a pretensão de saber toda a teologia e oferecer respostas acabadas, exceto nas questões essenciais do evangelho, comunicada a todo cristão na Palavra revelada de Deus, mediante iluminação do Espírito Santo. Cabe-nos, portanto, tendo em mãos este mapa que foi desenhado por nossos mestres, seguir os caminhos mais viáveis e seguros em busca de nosso aperfeiçoamento. Cabe-nos, mediante a graça de Deus, por meio de seu santo Espírito, debruçarmos sobre a Escritura, tendo-a na mais alta estima, pensando cada palavra que a compõe, desenhando em nossas mentes todas as pinturas que Deus nos revelou para, dia a dia, crescermos em comunhão com ele. A humildade precede a honra, diz-nos o provérbio. No nosso contexto, o status político e a busca de poder afogam nas águas turvas das intenções pessoais a precedência da honra, que até mesmo entre os descrentes é valorizada como marca essencial e limítrofe das relações de poder. Nosso Senhor Jesus Cristo nos ensinou, na prática, que a obtenção da autoridade não estabelece causa e conseqüência com as posições de poder. Ele nunca requereu poder político, cargos ou títulos. Sua principal virtude era se identificar pela autoridade de suas palavras, que nunca contrariavam sua prática, pela honra de seu compromisso e pela obediência ao Senhor. Mesmo sendo Deus, não quis ser igual, antes se tornou servo e foi obediente até a morte, e morte de cruz. Fomos chamados para a cruz. Não fomos chamados para projeção política nem para nos tornarmos conhecidos. Fomos chamados para tornar Cristo conhecido. Importa, portanto, que ele cresça e que nós diminuamos. Este é o nosso desafio: ser cada vez menos e tornar Cristo cada vez mais em nossas vidas. Como escreveu o evangelista Moody, “O princípio da grandeza é ser pequeno; o acréscimo da grandeza é ser menos; e a perfeição da grandeza é ser nada”.
O quinto desafio consiste em sermos gratos por aquilo que somos. A ingratidão é uma das piores paixões humanas. Jesus Cristo experimentou isto quando, ao curar os dez leprosos, apenas um voltou para agradecer a ele a cura efetuada. A nossa tendência pecaminosa é a de não sermos gratos. Mas, meus irmãos, saiamos daqui hoje com os nossos corações radiantes de gratidão. Foram muitos os momentos preciosos pelos quais passamos. Hoje as nossas famílias estão aqui para vivenciar conosco esta solenidade. Muitos membros de nossas igrejas estão aqui para nos abraçar. Alguns deles nem imaginam a dificuldades pelas quais passamos. Poucos vão poder compreender a razão de sofrermos ao longo destes anos. Porém, ao olhar nos olhos de cada um, podemos ler em suas próprias retinas, aclaradas pelo licor de suas lágrimas, a difícil trajetória até este dia. Mas as dificuldades não foram tudo. Elas trouxeram consigo as imensas e, talvez, mais significativas alegrias de toda nossa vida. É que a maneira como Deus nos molda é singular. O sofrimento, para muitas pessoas, é penalidade por pecados ou merecimento por conseqüência de ser. Entretanto, para nós, crentes no Senhor Jesus Cristo, o sofrimento é, antes de tudo, uma tipologia rica e instrutiva do significado do aperfeiçoamento que Deus deseja de cada um de nós. Passar por privações, como muitos de nós passamos, é poder experimentar o treinamento para a obra que é, antes de mais nada, o início das privações. É a maneira pela qual Deus nos diz, constantemente, que somos apenas servos. Não somos donos de nossas vidas, mas administradores, ou para usar um termo bíblico-teológico, despenseiros dos mistérios de Deus. Somos mordomos de nossa vida, o que significa que tudo o que passamos é para a glória de Deus e não nossa. Portanto, devemos ser gratos, porque Deus nos forjou nestes anos. Devemos ser gratos, porque ele usou os seus servos, nossos professores e os funcionários do Seminário, os pastores, presbíteros, diáconos com quem trabalhamos nas diversas igrejas; Deus usou os membros de nossas igrejas para nos moldar; Deus usou também os nossos familiares, alguns bem distantes geograficamente, outros mais próximos, mas muitos sempre presentes. Deus usou nossos tutores eclesiásticos. Alguns foram mais do que tutores, foram pais, pastores e amigos. Eles não precisavam ser amigos, bastava ser tutores. Mas o verdadeiro tutor é um mestre que ensina o seu discípulo. Muitos de nós aprendemos com eles. Por fim, meus irmãos, Deus usou cada um de nós para sermos bênção para os nossos pares. As discussões em sala de aula, com os debates acirrados, as brincadeiras, as imitações, os sorrisos, as lágrimas, os abraços apertados, os pedidos de perdão, os cafés, o futebol, o companheirismo. Tudo isso e muito mais foram marcas que serão indelevelmente gravadas em nossas memórias. Nossas memórias hoje registram este instante único e inesquecível. O presente que se constitui pelo passado e pela projeção do futuro. Um futuro que nos separa. Um futuro que leva cada um de nós para o seu espaço próprio e, quem sabe, solitário. Ao sairmos, talvez demoraremos muito para nos vermos outra vez. Talvez nem nos veremos mais. Porém, meus irmãos, algo extraordinário nos une, nos aproxima e garante que estaremos juntos, apesar de distantes: somos servos de um único Senhor, chamados para o mesmo propósito, e um dia nos encontraremos com ele e o veremos face a face e daremos conta de nossas obras. Este é o maior de todos os desafios.
Que Deus nos abençoe!
Muito obrigado!
Comentários
Abraço do irmão e colega,
Hermisten
Por sinal, diga-se de passagem, não somente eu, mais todos os colegas que tive oportunidade de comentar acharam o discurso da formatura muito pertinente, e extremamente bem preparado.
Com votos de sucesso no retorno a Minas,
Alexandre Lessa.
O seu discurso é edificante por ressaltar o cerne da atividade pastoral: Fundamentação bíblica: base da verdadeira piedade para o cuidado amoroso do rebanho que Deus nos confiou. Que Ele nos dê a graça de colocarmos esses princípios em prática em nossos ministérios!
Que o Senhor te abençoe e te guarde!
Normando
Parabéns. Que essa tocha que chegou à você continue passando à mãos tão boas quanto as tuas.
ab
Fôlton